sexta-feira, 23 de novembro de 2007

SOZINHA EM BUENOS AIRES...


Saí cedo, afinal tinha apenas um dia para desvendar os meandros da capital portenha. Porém, logo descobri, que meu cedo é muito cedo por aquelas paragens e tive que aquietar minha ansiedade, sentar na agradável padaria-café ao lado do meu hotel, que fica em frente ao Congresso Argentino e comer, uma vez mais, uma deliciosa ‘medialuna’- que belo nome para os croissants, hein? As medialunas são o pão francês dos argentinos, eles tomam seu café da manhã, pelo menos é o que se serve em todos os cafés e padarias: um copo de café com leite generoso, um copinho bem sem vergonha de suco de laranja (que em alguns lugares, nem natural é!) e três medialunas – que você pode escolher entre ‘grassa’ e ‘dulce’ (manteiga ou doce). Hummmm, é bom demais!
Buenos Aires parece ter mais padarias e lojas de guloseimas do que qualquer outro estabelecimento comercial. E deliciosas padarias com suas vitrines repletas de medialunas, fracturas, galletitas, palmeritas, bolos, tortas – todos nos acenando e convidando a ganhar preciosos quilos perdidos na duramente na véspera da viagem.
Pensando nos estabelecimentos comerciais, to aqui pensando que BA (Buenos Aires) não parece ter farmácias. Não me lembro de ter visto nenhuma em meu trajeto. Agora lojas de doces (principalmente alfajores) e livrarias....não passa uma esquina sem.
Será que o povo argentino não fica doente porque come muitas medialunas???
Enfim, 9hs, horário de abertura das lojas e da vida portenha. O dia estava lindo. Céu azul e temperatura amena, convidando-me a caminhar, sem pressa, pela cidade plana. Vamos lá!
Saí do hotel, como disse ao lado da praça do Congresso (vale a pena dar uma olhada nesse monumento deslumbrante – detalhe para os postes antigos, com aquelas luminárias de início do século, perfeitamente conservado e em uso). Cruzando a praca não tem como não prestar atenção aos inúmeros cachorros e seus donos passeando pela praça. Como tem cachorro em BA, e todos de raça. Acho que viralatas não têm vez por lá não! Peguei a Calle Montevideo (rua) que termina em uma das principais avenidas de BA, a Corrientes.
Fui caminhando lentamente, observando a ebulição dos comércios abrindo, carros indo e vindo, muitos táxis (o táxi na Argentina é muito barato, e as pessoas não costumam usar seus carros diariamente, preferem o táxi, por isso o que se vê muitos são táxis e não carros particulares) e alguns ônibus (como os ônibus são velhos por lá!). Passei por uma frutaria repleta de pomellos e cherrys (pomello é uma espécie de grapefruit e cherry nada mais é do que nosso morango).
Cheguei na Corrientes já agitada e em pleno funcionamento. Por todo lado que se olha, livrarias e mais livrarias. Teatros e casas de show, cafés e restaurantes sofisticados e muitas lojinhas de doces. Vida cultural ativa. Cidade civilizada. As pessoas passam rapidamente por mim, indo para o trabalho. Elegantes, discretos e um tanto altivos. Argentinos, né? Mas quer saber, eles têm bons motivos para isso! Povo culto. Nós, não!
Com o mapa na mão, meu destino final (ou inicial) era a Rua Florida, a 25 de março argentina. Com o nosso real em alta, o peso deles em baixa, é diversão feminina na certa!
Mas antes, cruzei o marco principal da cidade, o Obelisco, parecido em forma com o nosso no Ibirapuera, mas bem mais alto e largo. E totalmente destacado. Ele é uma espécie de cruzeta por onde as ‘calles’ e avenidas cruzam. Aliás, a Avenida 9 de julho é, certamente, a avenida mais larga que já vi na vida: quatro mãos de cada lado. Temos que atravessá-la por etapas. Tudo muito bem sinalizado.
Se tiver um mapa na mão (e tem mapa de todo tipo por lá) você anda a cidade inteira sem problema.
Chego na Florida, que nem é Florida de flores, apesar das barraquinhas de flores. Mas essas barraquinhas também estão por toda parte. Acho que nas casas argentinas, os vasos estão sempre ornamentados com flores frescas e vivas. Barraquinhas de flores e barraquinhas de doces...ai, ai!
Bem, como qualquer 25 de março que se preze, essa não é diferente. Gente saindo pelo ladrão. A diferença, fundamental aliás, é o tipo de gente. Nem dá pra comparar. Bom, lojas e mais lojas. De todo tipo: sofisticadas, populares, couro, sapatos, roupas, coisas pra casa.
Ah, tem um shopping no meio do caminho. E o shopping, como tudo em BA, é chique, antigo e preservado. Mistura em um prédio antigo maravilhoso, com uma abobada central toda pintada (como as das igrejas) lojas modernas e bem caras. É só pra passear mesmo.
Ah, e é só. Não tem shopping centers em BA. Paulistano se sente meio peixe fora d’água. Risos.
Bem, como sou uma mulher do povo. Risos. Entrei numa das inúmeras lojinhas populares de souvenirs e comprei um monte de estatuetazinhas de casais de tango, ímãs de geladeira coloridos do Caminito (que eu ainda não conhecia), cachemiras argentinas (aquelas blusas de lã fininhas e que dizem que esquenta e não acaba nunca – comprei para minhas três velhinhas: mãe, sogra e avó). Ah, e muitos alfajores (do popular mesmo) que custa 0,75 pesos e são deliciosos. Os da Havana só levaria uma caixa pequena para ver se vale a fama toda. Dizem que os alfajores havana precisam ser comidos de joelhos e rezando. Quanto exagero! Olha o que a marca faz!
Na verdade, os cafés Havana são muito charmosos. Sofisticados. Abrigam, normalmente turistas mais abonados e a fina flor da sociedade portenha!
Voltando à loja! Ah, a Falabella...que loja é aquela? Uma loja de departamentos, aliás, duas. Uma delas com roupas, sapatos, bijous. E a outra com coisas para a casa. Fiquei doidinha com as peças de madeira esculpidas a mão: gatos, girafas, camelos, um mundo de animais meio que balineses. E as máscaras, então? Bandejas, copos, taças. Tudo maravilhosos. Tudo barato. Ah, se eu tenho mais grana e menos bom senso!
Bom, os gatos balineses eu iria levar. Já estava de olho neles desde a 25 de março em uma loja indiana. Só que os bichanos por aqui custavam 180 reais e o bichano portenho, custava 49 pesos, algo em torno de 30 reais. Sem condição de deixar para trás. OK, mas como levar, dois gatos de madeira com 1 metro cada? Com os pés em pandarecos, cheio de bolhas e lotada de sacolas? Como? Como? Risos
Não tinha jeito, teria que fazer o que menos gosto de fazer. Voltar com o maridão. Que iria reclamar. Achar os gatos enormes! Dizer que não ia caber na mala. Que ia ter que levar na mão. Etc, etc, etc. mas, fazer o que, né? Os gatos, Jorge e Pablo (já tinha até dado nome pra eles) iam para o Brasil e ponto final.
Resolvi voltar. Já eram mais de 15h30 e meus pés, coitados, estavam a ponto de me deserdar! E não tinha comido nada ainda. Já pensou? Em uma cidade como aquela? Ficar com fome?
Bom, não faltavam cafés no meu caminho de volta. E tinha um em especial que fiquei de olho na ida, com suas mesinhas na calçada e grandes sombreros e todo rodeado de uma cerca viva. Lindo! Charmoso! Bem ‘buenos aires’. Mas quem disse que meus pés agüentaram chegar nele? Qual, que esperança. Parei na primeira mesinha com cadeira que achei no caminho. Felizmente, quase todas as mesinhas e cadeiras pertencem a cafés charmosos em BA. E esta era bem em frente ao Obelisco. Fiquei ali, tomando jugo de naranja, tostados de ramon e queso e, é claro, medialunas! Risos. Eu queria uma bela empanada, mas tinha acabado. Como pode? Acabar empanada na Argentina? Que absurdo! Abri meu García Marques que comprei pra ler no avião, mas que levava na bolsa pra todo lado. Não dá pra começar a ler García Marques e parar.
Pois bem, fiquei ali, vendo a tarde portenha chegar, observando as pessoas indo e vindo. Os táxis em enorme quantidade, os ônibus velhos, e a vida que seguia seu curso. Que delícia! Não dava vontade sair dali. Mas ainda me restava uns 20 quarteirões a vencer. E, apesar de dizerem que a noite é segura em BA, eu não queria tirar a prova dos nove.
Recoloquei minha sapatilha torturante no pé. E segui caminho. Tive que voltar pela Corrientes, pois tinha deixado alguns livros reservados em um sebo pra pegar na volta. Minha idéia inicial era pegar um Subterrâneo (o metrô deles).
Aliás, o metrô mereceria um capítulo à parte. Foi construído em 1913. Dá pra pensar nisso? O nosso é de 1975, se não me engano. Muito bem, os trens são de madeira. Você leu certinho: de madeira. Com grandes espelhos do lado de dentro, iluminação daquela época. As estações também são parecidas com o trem. Antigas. O interessante é que os trens quando chegam à estação, não abrem as portas automaticamente, as pessoas é que abrem as portas para sair. E, muitas vezes com o trem em movimento! É sério! Um loucura. Muito longe da realidade de nossos metrôs.
Mas o mais legal é que eles cumprem sua função. Funcionam muito bem. As pessoas entram e saem ordenadamente. Mesmo em horários mais apertados. Civilização, meus caros! Educação! O que nos falta. Fiquei imaginando esses trens aqui em sampa, na hora do rush, na estação da Sé. Morte certa! E em montes!
Esse negócio de abrir as portas e pular com o trem andando. Vixe!
Agora, que nosso metrô é um espetáculo, lá isso é! E funciona muito bem com quase 3 milhões de usuários por dia. Não tem nem como pensar nessa quantidade de pessoas em Buenos Aires. É outra realidade mesmo!
Resolvi voltar pela Calle Uruguay e não pela Montevideo. E me deparei com a igreja mais linda que já vi. Escondidinha entre prédios antigos e em um quarteirão apertado, jamais a teria visto se não voltasse por onde voltei.
Mesmo com os pés doendo, não resisti. Entrei! E como valeu a pena. Lá dentro, aquele silêncio divino, característico das igrejas católicas. A abóbada central, toda de vitral, deixava entrar os últimos raios de sol da tarde e jogava luzes coloridas no interior sombrio da igreja. E como estava fresco lá dentro. Sentei em um banco, fechei os olhos, esqueci a dor nos pés e agradeci por estar ali, por vivenciar novas sensações, conhecer novos lugares, novas pessoas, novos hábitos, novos sabores, cores e odores. E por estar ali, naquela paz em profunda comunhão com Deus.
Taí algo que não entendo nas igrejas evangélicas: por que não ficam abertas o dia inteiro? Por que não deixam seus seguidores entrarem no horário que quiserem? Afinal, o objetivo maior de qualquer igreja é ser o elo entre o homem e Deus. E cadê que você encontrar igrejas evangélicas abertas? Só abrem nos horários dos cultos. Quanto desperdício de paz!
Nem sei quanto tempo fiquei ali. Pareceu uma eternidade, mas foram apenas 15 minutos. Como o tempo não representa nada, né?
Voltei ao hotel. Deixei as sacolas. E fui até o mercadinho que ficava na outra esquina comprar outra coisa fundamental em viagens: café!
Não deixo meu marido voltar de suas viagens pelo Brasil, sem um pacote de café daquele lugar. Viciada que sou por esta bebida dos deuses, já tive a oportunidade de tomar café de tudo quanto é canto de nosso país. Não poderia voltar sem o café portenho. Que mais tarde se revelou uma porcaria. Ou eu não soube comprar, ou eles não sabem tomar café. Risos. Eu comprei um pó que já vinha adicionado de açúcar. Para quem me conhece, sabe que não tomo café adoçado de jeito nenhum... Essa eu fiquei a ver navios.
Bom, já era mais de 20hs quando o maridão chegou do Congresso e eu cheia de historia pra contar.
Ah! Voltamos no dia seguinte lá na Falabella e o Pablo e Jorge voltaram comigo. Estão aqui na minha sala, logo na entrada dando boas vindas àqueles que vierem me visitar!
Meu dia de aventuras solitária em Buenos Aires foi maravilhoso! Aconselho qualquer um a visitá-la. Até quem nunca pensou em fazer uma viagem para o exterior pode pensar no caso. As passagens aéreas estão super competitivas. Sai mais barato ir a Buenos Aires do que ir à Salvador ou qualquer outro lugar do Nordeste. Os preços por lá estão vantajosos para nosso Real. E a cidade é um misto de arquitetura, gastronomia e lazer inesquecíveis.
Ah, e os argentinos nem são tudo isso que falamos, graças à nossa rivalidade futebolística. Tem alguns meio metidos, outros meio ranzinzas. Mas a maioria é gentil, amável, solícitos. Procuram nos entender, se nosso espanhol não dá nem pro gasto. Mutios falam português. Isso sem falar no tanto de brasileiros que moram por lá.
Vale a pena! Pra mim, valeu e muito! Mas, ai que saudade de uma praia!